Cisjordânia: “Não sei como é que ainda estamos de pé”, lamenta director executivo do Patriarcado Latino de Jerusalém

(Filipe D’Avillez e Paulo Aido) – A guerra voltou a Gaza depois de algumas semanas de paz frágil. Mas ali ao lado, na Cisjordânia, a situação também não melhorou, como constatou uma delegação da Fundação AIS. Os Cristãos têm de lutar para encontrar razões para terem esperança no futuro.

Foto: Fundação AIS

De Ain ‘Arik até ao aeroporto Ben Gurion são necessários cerca de 20 minutos de carro. Ou seriam, se não fossem os bloqueios de estrada e o facto de os Palestinianos estarem proibidos de utilizar o Ben Gurion desde o início da guerra em Gaza.

As consequências destes obstáculos são bem reais para os 85 jovens cristãos palestinianos que tencionam ir a Roma para o Jubileu dos Jovens, em Julho e Agosto. Em vez de uma viagem de 20 minutos até ao aeroporto, enfrentam uma viagem nocturna de autocarro até à Jordânia e um grande aumento dos custos. Este é o novo normal nos territórios palestinianos da Terra Santa, disse o Padre Louis Salman, responsável pela capelania pastoral dos jovens em toda a Cisjordânia, Gaza e Jerusalém, a uma delegação da Fundação AIS que visitou a Terra Santa.

As restrições às deslocações fazem com que as pessoas se sintam isoladas e encurraladas, a falta de oportunidades de emprego enfraquece as suas perspectivas e a exposição constante à violência deixa-as traumatizadas.

SEGURANÇA REFORÇADA

Com o fim do cessar-fogo em Gaza, após uma série de bombardeamentos que se iniciaram por parte do Exército de Israel na terça-feira, dia 18 de Março, tudo parece agora mais complicado. Mas antes, ainda com o cessar-fogo em vigor, poder-se-ia dizer que o futuro seria um pouco mais risonho para os Cristãos em toda a Terra Santa? “Honestamente? Para nós, na Cisjordânia, o cessar-fogo tornou a situação ainda pior”, disse o Padre Louis. “Desde o cessar-fogo, fecharam ainda mais estradas, tornando as deslocações ainda mais difíceis. A estrada de Jifna para Zababdeh costumava demorar cerca de duas horas, agora demora quatro”, explica o sacerdote nascido na Jordânia.

Com o acordo de cessar-fogo, Israel comprometeu-se a libertar os prisioneiros palestinianos, muitos dos quais regressaram à Cisjordânia. “Por causa da troca de prisioneiros, a segurança foi reforçada”, explica o Padre Louis.

Cardeal Pierbattista Pizzaballa, Patriarca Latino de Jerusalém, concordou durante um encontro com a Fundação AIS em Jerusalém. “Sem dúvida, a situação na Cisjordânia está pior. Quando o cessar-fogo começou em Gaza, começaram as operações na Cisjordânia, com centenas de postos de controlo e operações em Jenin (uma importante cidade palestiniana).”

900 POSTOS DE CONTROLO

Sami El-Yousef, director executivo do Patriarcado Latino de Jerusalém, apoiou estas posições com factos. “Assistimos a uma maior anexação de terras na Cisjordânia, bem como à expulsão de cerca de 16 mil pessoas dos campos de refugiados em Jenin, com as infra-estruturas físicas a serem arrasadas, pelo que não têm para onde regressar. A Cisjordânia está agora completamente fragmentada, com 185 portões e mais de 900 postos de controlo, mas, devido ao que se tem passado em Gaza, nada disto recebe muita atenção internacional.”

“Não sei como é que ainda estamos de pé. A maré está contra nós”, afirmou Sami El-Yousef. No entanto, tentou encontrar um lado positivo em toda a situação.

Como Igreja, sentimo-nos mais fortes do que há um ano e meio atrás, especificamente devido às nossas contribuições para a sociedade em geral. Conseguimos manter os nossos serviços, expandi-los em alguns pontos e servir as comunidades de Gaza e da Cisjordânia que foram mais afectadas pela guerra, e estamos a preparar-nos para sermos mais úteis depois da guerra.”

“AMIGOS EM TODO O MUNDO”

Por exemplo, na sequência das preocupações expressas pelo Patriarca Pizzaballa de que a população de Gaza estava a sofrer com a falta de produtos frescos, o Patriarcado Latino de Jerusalém conseguiu assegurar o fornecimento de fruta e legumes a Gaza durante vários meses, e não apenas à pequena comunidade de cristãos que ainda vivem nos complexos católicos e ortodoxos.

“Até hoje, as pessoas falam de como a Igreja as defendeu. De acordo com os desejos do Patriarca, estendemos a nossa generosidade aos nossos vizinhos. Estamos muito orgulhosos de ter feito o que fizemos durante este período”, explicou Sami El-Yousef.

Grande parte deste trabalho só foi possível graças à ajuda prestada pela Fundação AIS, um facto que o director executivo do Patriarcado Latino refere com extrema gratidão. “O último ano e meio solidificou o que nós, Cristãos, já sabíamos, que temos amigos em todo o mundo, que nos ajudam não só com dinheiro, mas também com apoio moral”, explicou.

MENSAGEM PARA SETÚBAL

Sinal desta ajuda, o patriarca latino de Jerusalém enviou, entretanto, uma mensagem para a Diocese de Setúbal, em agradecimento pela renúncia quaresmal que se destina este ano às crianças afectadas pela guerra na Terra Santa.

Nessa mensagem-vídeo, o cardeal Pierbattista Pizzaballa sublinha a situação na área de Belém, que “é muito complicada, não só por causa dos contínuos confrontos entre colonos, o exército israelita e a população palestiniana, mas também por causa da falta de oportunidades de emprego”. A falta de peregrinos está também a criar “muitos problemas para as famílias”, a que se tem de acrescentar, diz ainda o prelado, a questão da criminalidade.

“A situação permanece muito difícil” – diz ainda o patriarca latino. “Estamos totalmente perdidos do ponto de vista humano, mas em Deus nada é impossível.”

Lembrando que se está a viver o tempo de Quaresma, o cardeal Pizzaballa refere ainda, na mensagem para a Diocese de Setúbal, em Portugal, diz que este é um período de penitência e que é precisa “muita penitência aqui pelos nossos pecados, porque a situação aqui de ódio e desprezo é terrível”.