(Pe. Jerónimo Nunes) – “Está comprovado que as alterações climáticas em curso derivam do sobreaquecimento da terra, causado principalmente pelo aumento na atmosfera dos gases com efeito de estufa, causado por sua vez pela atividade humana, que, nas últimas décadas, se tornou insustentável para o ecossistema. A ambição de produzir e possuir transformou-se em obsessão e resultou numa ganância sem limites, que fez do ambiente o objeto duma exploração desenfreada. O clima enlouquecido soa como um alerta para acabarmos com tal delírio de omnipotência. Com humildade e coragem, voltemos a reconhecer a nossa limitação como única estrada para uma vida plena”.

Estas palavras do Papa Francisco, à Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP28), baseiam-se em dados científicos, fundamento da encíclica Laudato Sí (2015) e exortação Laudate Deum (4.10.2023). Acreditam nela os jovens que em muitas partes do mundo gritam pela preservação do ambiente. Mas não acreditam os donos do mundo que conseguem mandar nos atuais governos. O Presidente da COP28, Sultão Al Jaber, Ministro dos Emirados Árabes e presidente da sua petrolífera, afirma que “diminuir a exploração do petróleo será lento, é voltar ao tempo das cavernas”. Esquece os dados científicos e as guerras que as petrolíferas provocam em quase todos os países possuidores do “ouro negro”. Ao anúncio de petróleo em Angola, Salazar respondeu: “Era o que me faltava”. A guerra pelo petróleo prolongou-se em Angola por dezenas de anos, depois da independência, até que o promotor da guerra recebesse autorização para explorar petróleo. Os antigos ladrões armados gritavam: “o dinheiro ou a vida”. Hoje rouba-se tudo. Qual é o país com petróleo que vive em paz e democracia?
Claro que, a Arábia e as empresas habituadas a explorar países inteiros, não querem mudanças. As instituições multilaterais precisam de capacidade de controlar a execução dos planos. Já foram realizados 32 encontros. Nenhum conseguiu realizar promessas e objetivos.
A transformação climática prejudica o mundo inteiro (com exceção do 1% mais rico) e ameaça de morte as populações indígenas e outras vítimas da desflorestação, do drama da fome, da insegurança hídrica e alimentar, dos fluxos migratórios.

António Guterres pediu aos líderes mundiais que quebrem “o ciclo mortal” do aquecimento e do seu impacto devastador: “Estamos presos num ciclo mortal”, declarou, regressando de uma visita à Antártica, “um gigante adormecido (…) despertado pelo caos climático”.
O clima depende do consumo dos fósseis mas também de outras técnicas abusivas sobre a natureza. Por isso o Papa, unindo diversos líderes religiosos, promoveu em Abu Gabi a Faith Expo (Exposição da Fé) inaugurada com estas palavras: “Torna-se necessário mudar o modo de viver e, por conseguinte, educar para estilos de vida sóbrios e fraternos. Trata-se duma ação irrenunciável para as religiões, chamadas também a educar para a contemplação, porque a criação é um dom a acolher, e não apenas um sistema a preservar. Um mundo pobre em contemplação será um mundo poluído na alma, que continuará a descartar pessoas e a produzir resíduos; um mundo sem oração dirá muitas palavras, mas, desprovido de compaixão e de lágrimas, viverá apenas dum materialismo feito de dinheiro e de armas…Uma casa só se torna habitável para todos, se reinar no seu interior um clima de paz. O mesmo acontece com a nossa Terra, cujo solo parece unir-se ao grito das crianças e dos pobres para fazer chegar ao céu a mesma e única súplica: paz! Salvaguardar a paz é tarefa também das religiões. Como diz Francisco de Assis: «A paz que proclamais com os vossos lábios, tende-a ainda mais abundante nos vossos corações».”
Deus não depende de governos. Mas a continuidade da criação, sim, depende. Deus pode reinventar outro mundo, mas conta com a ação da Igreja, dos cristãos de todas as religiões e até dos jovens que apelidamos de radicais, mas que não desistem de lutar por uma casa digna para todos.
Publicado na versão impressa de janeiro de 2024.


