A Ir. Aparecida Queiroz, brasileira, da Congregação das Filhas Jesus, psicóloga, trabalha há vários anos na Diocese de Pemba, no nordeste de Moçambique. Esta consagrada está na coordenação dos projetos de emergência desta Diocese, cujo primeiro bispo, D. José dos Santos Garcia, foi Missionário da Boa Nova. Como missionária psicóloga, convive de perto com o drama da guerra e das pessoas por ela devastadas, trabalhando para minorar o seu sofrimento e procurando infundir esperança de um novo amanhecer. A Ir. Aparecida está na linha da frente da missão de ser frágil com os frágeis.

(Ir. Aparecida Queiroz, Filhas de Jesus, Diocese de Pemba) – Desde outubro de 2017, a província de Cabo Delgado, em Moçambique, vive uma escalada de violência que transformou drasticamente a vida de milhares de pessoas. O que começou como ataques isolados no Norte [da Diocese] logo se alastrou, deixando um rastro de destruição.
Para quem enfrenta essa realidade, o cenário é desolador: rostos marcados pela dor, olhares perdidos no desespero. Expressões de sofrimento substituem a segurança de outrora. Homens, mulheres e crianças, antes enraizados em suas terras, agora se veem forçados a abandonar tudo. O que um dia lhes conferiu identidade – casas, laços, campos, memórias – hoje se resume a uma trouxa improvisada, equilibrada sobre a cabeça.
A tragédia vai além da perda material. O impacto emocional é profundo e, muitas vezes, invisível. Além de pertences, perderam-se locais de oração, espaços de convivência e até a esperança. As famílias deslocadas vivem um ciclo contínuo de fuga, buscando refúgio onde a estabilidade parece inalcançável. A privação é generalizada: crianças sem escola, famílias sem acesso a plantações, atendimento médico ou comida suficiente. A fome se torna uma ameaça constante.

Diante desse cenário devastador, a ajuda da Diocese de Pemba vai além do suporte material. As equipas missionárias oferecem acolhimento, apoio espiritual e psicológico, garantindo que essas pessoas sejam ouvidas e cuidadas. Além da distribuição de alimentos, materiais de abrigo e higiene, a assistência busca restaurar a dignidade por meio da capacitação, oferecendo oportunidades para um futuro minimamente digno.
Há, porém, uma dor silenciosa: o trauma. A violência, o medo e as perdas sucessivas deixam marcas profundas, dificultando qualquer tentativa de normalidade. Por isso, desde 2020 – início das grandes ondas de deslocamento –, a Diocese de Pemba desenvolve um trabalho sistemático de apoio psicossocial. Criou grupos de apoio organizados por género e idade, conduzidos por monitores treinados para fortalecer a resiliência e a estabilidade emocional. O processo inclui encontros regulares e avaliações contínuas, com encaminhamento de casos críticos a psicólogos. As atividades são adaptadas à cultura e à língua dos participantes. Nos reassentamentos [das pessoas deslocadas], a seleção ocorre com apoio dos líderes comunitários, sendo a participação voluntária. Além disso, visitas domiciliares identificam e acompanham pessoas em maior situação de vulnerabilidade.
Para tornar este trabalho possível, a Diocese de Pemba contou com a colaboração de organizações como Fundação Ajuda a Igreja que Sofre, Caritas Portuguesa, Caritas Espanhola e Manos Unidas, que ajudaram a custear despesas de transporte e capacitação, e com a ASPICO (associação de psicólogos moçambicana), na intervenção em saúde mental para os casos que exigiam atenção especializada.
Este trabalho tem sido fundamental para a recuperação de milhares de pessoas do trauma. No entanto, essa continua sendo uma necessidade urgente, que merece um investimento contínuo. Não podemos deixar de apoiar e investir em iniciativas voltadas para a saúde mental, essenciais para ajudar na reconstrução da vida de tantas pessoas.


