
(Eva Dias) – Nas décadas de 60 e 70 de Novecentos, a urgência da libertação dos territórios africanos sob o domínio de Portugal e o fim da guerra colonial imprimia aos acontecimentos nestas realidades geográficas uma dinâmica mais acelerada que aquela que se vivia na metrópole. Esta urgência de mudança desembocou na Revolução de Abril de 1974, colocando um ponto final em mais de 40 anos de ditadura, 13 anos de uma guerra sangrenta e no reconhecimento do direito à independência dos territórios ultramarinos. Os processos de independência destes territórios tiveram repercussão nas páginas da Boa Nova, de modo especial Moçambique e Angola, países onde trabalhava a maioria dos agentes pastorais da Sociedade Missionária Portuguesa naquele continente.
Em Moçambique, no período que precedeu a Revolução, algumas vozes do episcopado português elevaram-se para lembrar o alinhamento da Igreja com as determinações do Concílio Vaticano II (Comunicado da Conferência Episcopal de Moçambique, publicado em 5 de março de 1974. BN, Ano L, abr. 1974, pp.5-6). D. Manuel Vieira Pinto, bispo de Nampula, foi o rosto mais conhecido, cujo posicionamento (“Repensar a Guerra”, mensagem para o 7.º Dia Mundial da Paz; “Imperativo de consciência”, assinado pelo prelado e pelos Missionários Combonianos na diocese), valeu-lhe a expulsão para Portugal, onde chegou em 15 de abril de 1974 (BN, mai. 1974, pp.3-5).
A mudança do enquadramento político conduziu ao posicionamento dos institutos missionários e religiosos de Portugal face à nova conjuntura (BN, set. 1974, pp.11-13). Também a Sociedade Missionária Portuguesa refletiu seriamente sobre a missionação dos seus membros e definiu novas linhas de rumo, emanadas da III Assembleia Geral, reunida entre 11 de julho e 28 de agosto de 1974, em Valadares, através do documento “Para um compromisso cada vez mais evangélico ao serviço das igrejas locais” (BN, out. 1974, pp.11-20). Também na 1.ª Assembleia Regional, realizada em finais de dezembro desse ano em Nampula, os missionários da Boa Nova reuniram-se para rever métodos de trabalho e estudar a renovação de mentalidades e estruturas (BN, fev. 1975, pp.10-11; mar. 175, pp.27-29).

Em Moçambique, pela carta pastoral de agosto de 1974, o episcopado pronunciou-se sobre a independência do país, apresentando a renúncia aos cargos, se fosse vontade do Santo Padre, de modo a operar-se a renovação da hierarquia moçambicana (BN, out. 1974, pp.27-32). Por sua vez, os consagrados moçambicanos reuniram-se no Centro Catequético do Guiúa (Inhambane) para refletir sobre a situação e o futuro do país, em vista à africanização da Igreja moçambicana (BN, dez. 1974, pp.19-26; mai. 1975, pp.12-13).
A independência de Moçambique viria a acontecer em 25 de junho de 1975 (BN, jul. 1975, pp.10, 22-23; out. 1975, pp. 8-9). No turbilhão deste processo, aqueles que se encontravam na linha da frente foram os mais afetados. A nacionalização dos bens da Igreja e a guerra civil que se seguiu constituíram enormes desafios para as populações e para os missionários. Alguns missionários, pertencentes à Sociedade Missionária e outros institutos, foram expulsos (BN, jul. 1974, pp.4-6; dez. 1975, pp. 3, 29-31; dez. 1976, p.11); outros presos; e outros ainda impedidos de entrar no país (BN, jan. 1976, p.14). Uns abandonaram o território, rumo a outras missões (BN, ago-set. 1976, pp.16-17; …); outros aguentaram firmes, adaptando-se às exigências do novo regime, para continuarem junto do povo nesta hora decisiva, apoiando-o nas suas necessidades físicas e espirituais. Os casos revelam quanto a aurora de um Moçambique independente estava longe de trazer paz e estabilidade ao país recém-nascido.


