Párocos pelo Sínodo: Um Encontro Internacional

(Pe. Sérgio Leal, pároco de Guetim e Anta) – No dia 9 de Outubro de 2021, o Papa Francisco inaugurava solenemente o percurso sinodal da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos com o tema: «Para uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação e Missão». Este caminho sinodal tem gerado um conjunto de oportunidades e resistências, abrindo novas perspetivas e rasgando novas janelas de esperança para uma Igreja que se procura situar no mundo contemporâneo como lugar de anúncio do Evangelho de Jesus Cristo.

Neste encontro participaram 193 párocos, oriundos de 90 países dos cinco continentes. Foto: Pe. Sérgio Leal

Este Sínodo é já considerado, por muitos, como o evento eclesial mais importante depois do Concílio Vaticano II. Contudo, importa não olhar para este evento sinodal apenas como um sínodo sobre a sinodalidade, mas uma importante etapa de reflexão e projeção sobre a evangelização no mundo contemporâneo, como lugar de escuta da realidade concreta, para gerar uma decisão e projeção que responda aos desafios da realidade hodierna e à novidade permanente do Evangelho. 

Depois de um longo caminho de escuta que começou pelas Igrejas Locais, nas suas mais variadas realidades, foram elaboradas as sínteses diocesanas, a partir das quais se redigiram as sínteses nacionais, que serviram de base para o documento da etapa continental. A partir das assembleias continentais e das suas conclusões, foi redigido o Instrumentum Laboris para a assembleia realizada em Roma em Outubro passado. 

A Secretaria Geral do Sínodo, depois de apresentar o relatório de síntese desta primeira assembleia, pediu que o tempo até à assembleia seguinte, em Outubro de 2024, fosse um tempo de trabalho para aprofundar e desenvolver o caminho sinodal. A elaboração do documento de síntese desta assembleia foi desenhada de modo aberto e interpelador, propondo um novo aprofundamento e desenvolvimento. Cada um dos seus temas foi apresentado a partir do tríptico: convergências, questões a aprofundar e propostas. Deste modo, a Secretaria Geral do Sínodo propôs um caminho de escuta que ajudasse a desenvolver e consolidar cada etapa. 

O encontro do Pe. Sérgio Leal com o Papa Francisco, em 02 de maio de 2024. Foto: Pe. Sérgio Leal

Este encontro internacional de párocos insere-se neste dinamismo, uma vez que, como afirmou o Cardeal Mario Grech, era importante, nesta fase do processo sinodal, escutar os párocos, tendo em conta que eles trabalham de modo direto com todo o Povo de Deus, na evangelização próxima e concreta junto das mais diversas realidades. 

Eu fui surpreendido com uma chamada do meu bispo diocesano, convidando-me a participar neste encontro sinodal, representando a Conferência Episcopal Portuguesa, juntamente com o Padre Adelino Guarda, da diocese de Leiria-Fátima. A participação de padres portugueses contou ainda com a presença do Padre António Bacelar, pároco da diocese do Porto, a convite da Secretaria Geral do Sínodo.

A assembleia decorreu de 29 de Abril a 2 de Maio de 2024, em Roma. Os primeiros dias, de 29 de Abril a 1 de Maio, decorreram em Sacrofano, na Domus Fraterna. No dia 2 de Maio, os participantes dirigiram-se ao Vaticano, para o encontro com o Papa Francisco. Neste encontro houve oportunidade para colocar perguntas e escutar o Santo Padre, num discurso em tom coloquial e fraterno, apontando as prioridades e urgências do caminho eclesial na realidade paroquial. 

Participaram neste encontro 193 párocos, de 90 países dos cinco continentes. Portanto, a primeira nota que posso sublinhar deste encontro é a catolicidade vivida. Desde os trabalhos de grupo, às refeições e momentos de convívio, era possível ouvir falar as mais diversas línguas, as mais diversas realidades sociais, culturais e eclesiais, bem como as mais diversas prioridades e perspetivas sobre a evangelização e a missão. Se algumas prioridades e âmbitos de ação eram partilhados de modo conjunto, outras realidades encontram realizações diferentes nas mais diversas geografias. A título de exemplo, enquanto no ocidente sublinhávamos a secularização ou a falta de vocações ao ministério ordenado, noutras geografias falava-se do elevado número de vocações e de um cristianismo emergente.       

A metodologia de trabalho deste encontro foi a «Conversação no Espírito», que tem sido a metodologia usada neste percurso sinodal. O mais importante deste caminho sinodal não é o que cada um pensa, mas o que somos capazes de pensar em conjunto, discernindo aquilo que o Espírito Santo nos está a pedir aqui e agora. Esta metodologia de trabalho assenta no discernimento e na oração, procurando perscrutar aquilo que o Espírito suscita na Igreja, a partir da escuta e da partilha. Os 18 grupos de trabalho contavam com a ajuda de um facilitador que ajudava a conduzir os trabalhos, segundo a metodologia apresentada.

O Pe. Sérgio Leal numa sessão com o grupo de trabalho de língua italiana. Foto: Pe. Sérgio Leal

Os dias de trabalho eram intensos e muito preenchidos, mas ricos e fecundos na partilha e no encontro. O pequeno-almoço era servido às 7h e às 8h rezávamos a oração de Laudes para dar início aos trabalhos. Cada um dos três dias de assembleia em Sacrofano era orientado a partir de um dos temas do Relatório de Síntese: O rosto da Igreja Sinodal; Todos discípulos, todos missionários; Tecer laços, construir comunidade. Cada um destes dias começava com uma breve introdução sobre o tema dos peritos deste encontro: D. Pablo Virgilio David (Filipinas); Padre Benedict Ndubueze Ejeh (Nigéria); Mons. Tomáš Halík (República Checa); Padre Gilles Routhier (Canadá) e a Prof. María Lía Zervino (Argentina). A esta proposta introdutória seguia-se um tempo de oração pessoal onde cada um era convidado a pensar, à luz do Espírito, aquilo que pretendia partilhar no grupo. O Santíssimo Sacramento era exposto na igreja e os participantes escolhiam o lugar onde pretendiam fazer a sua reflexão. Uns dirigiam-se para a igreja, outros para o jardim ou para a mata. Este tempo era fundamental para situarmos o âmbito da nossa reflexão e da nossa partilha. Não era um debate de ideias ou um exercício académico, mas um tempo de discernimento a partir de Jesus, na força do Espírito, para que pudéssemos realizar a vontade do Pai. 

Regressados ao grupo, a primeira etapa do trabalho era a escuta. Cada elemento do grupo, num período que não devia exceder os cinco minutos, partilhava aquilo que o Espírito lhe inspirou. Depois de um tempo de silêncio para acolher a partilha, cada um voltava a ter a palavra, mas agora num período mais breve, em que partilhava aquilo que ressoou em si de modo especial na escuta do outro. A este tempo de partilha a partir da escuta, seguia-se mais um tempo de silêncio. Finalmente, numa terceira etapa desta metodologia, passava-se ao «Construir Juntos». Nesta fase do trabalho de grupo, dialogávamos sobre o percurso realizado: as convergências, as resistências, as vozes proféticas. O objetivo não era recolher as opiniões da maioria, mas passar a escrito aquilo que o Espírito tinha suscitado em nós, naquele tempo de conversação. Deste percurso, que ocupava toda a manhã, emergia uma proposta do grupo para o plenário, que deveria ser entregue à Secretaria Geral. Da parte da tarde, tinha lugar o plenário dos grupos e havia tempo para intervenções livres que eram intercaladas com palavras de síntese e reflexão dos peritos. No final do dia, voltávamos ao grupo para enriquecer o nosso texto com as propostas que entendêssemos ser significativas e que poderiam aprofundar e consolidar a nossa proposta.

Não foi redigido nenhum documento síntese deste encontro, porque o objetivo era recolher as sínteses de cada grupo como mais um contributo para a elaboração do Instrumentum Laboris da próxima assembleia sinodal, em Outubro.  

Cada um dos 18 grupos de trabalho contou com o auxílio de um facilitador, para orientar os trabalhos de acordo com a metodologia proposta. Foto: Pe. Sérgio Leal 

O último dia do encontro foi marcado pela presença do Santo Padre. O Papa Francisco respondeu a um conjunto de perguntas e deixou uma mensagem de estímulo e entusiasmo para a renovação da vida eclesial, a partir da realidade paroquial. No final desse encontro, o Papa constituiu os participantes como missionários da sinodalidade, para que possam, junto das suas dioceses e conferências episcopais, continuar este dinamismo sinodal, realizando encontros, segundo esta metodologia, para responder com ousadia e coragem aos desafios da missão. O Santo Padre enviou neste dia uma carta aos párocos do mundo inteiro, pedindo que as paróquias sejam lugares de exercício sinodal, através do reconhecimento dos dons e carismas que o Senhor suscita no Povo de Deus, levando a cabo processos de discernimento comunitário que promovam a fraternidade e a comunhão.

Que o caminho a percorrer, não impeça de olhar com gratidão o caminho percorrido. A sinodalidade é caminho, por isso, é urgente desencadear a nível local processos de discernimento que fomentem a participação e corresponsabilidade de todos. A valorização dos órgãos de corresponsabilidade e participação, bem como a criação de novas instâncias e processos de escuta, devem desencadear processos de decisão, onde a comunidade cristã é envolvida e se possa sublinhar que o sujeito de toda a ação eclesial é o inteiro Povo de Deus, na variedade de dons, carismas e ministérios.