PÓRTICO | Construamos a Paz na Justiça e no Amor

(Pe. Rui Ferreira, diretor da Revista Boa Nova) – “A Paz esteja com todos vós”. Durante vários dias o olhar do mundo virou-se para Roma à espera de conhecer o novo Papa. Na sua primeira aparição, após um longo silêncio, emocionado e emocionante, Leão XIV dirigiu-se à cidade e ao mundo fazendo ecoar “a primeira saudação de Cristo Ressuscitado” e desejando que a paz entre no nosso coração e chegue às nossas famílias, a todas as pessoas, a todos os povos, a toda a terra. 

“Esta é a paz de Cristo Ressuscitado, uma paz desarmada e uma paz desarmante, humilde e perseverante. Que vem de Deus, do Deus que nos ama a todos incondicionalmente”

(Leão XIV)

Infelizmente, olhando a realidade, parece que o mundo vai em contramão com este anseio profundo de justiça, paz e fraternidade entre todos os povos e nações, pois todos somos irmãos. No início de 2025, assistimos à saída dos E.U.A. da Organização Mundial Saúde e da suspensão da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), decisões unilaterais que denotam egoísmo e fechamento, colocando em risco a vida de milhões de pessoas carenciadas em todo o mundo. 

É caso para perguntar: mundo para onde vais? Para onde vamos, enquanto continua a matança de civis inocentes, sobretudo mulheres e crianças, em Gaza, na Ucrânia, em Cabo Delgado, e em inumeráveis guerras esquecidas, que beneficiam apenas os traficantes de armas. O Papa Francisco repetiu incansavelmente que a guerra é sempre uma loucura e uma derrota para toda a humanidade. 

Já em 1973 S. Paulo VI bradava: “a paz é possível! A paz é possível, se for verdadeiramente querida; e se a paz é possível, ela é obrigatória”. Para tal, “é necessário ter a coragem da paz. Não a da força bruta, mas a do amor: todos os homens são meus irmãos, e não pode haver paz sem justiça”. Foi com esta convicção que, há mais de 50 anos, um grupo de jovens militares se ergueu contra a loucura da guerra colonial e iniciou um movimento que culminou na emancipação de povos irmãos e no nascimento de várias nações independentes. 

Tal foi o caso de Moçambique que, no dia 25 de junho, celebra o cinquentenário da sua independência. A liberdade não se conquista do dia para a noite. É um longo caminhar que exige responsabilidade e maturidade. Entre luzes e trevas, como as da guerra civil que flagelou o país durante 16 anos, o povo moçambicano perseverou na esperança da paz que brota da justiça e do diálogo, porque “a unidade prevalece sobre o conflito” (Papa Francisco). 

O maior contributo da Igreja tem sido caminhar lado-a-lado com o povo, partilhando as suas dores e alegrias. Perseguida e despojada, após a independência, a Igreja renasceu livre para servir e promover a paz. D. Manuel Vieira Pinto e D. Jaime Gonçalves, Arcebispo da Beira, mediador do Acordo Geral de Paz de Moçambique, em 1992, são figuras incontornáveis, mas à sua sombra escondem-se muitos homens e mulheres, testemunhas credíveis da Paz do Ressuscitado.  

Apesar das sombras que ainda pairam sobre a jovem nação moçambicana, permanece viva a esperança num país mais justo, livre e fraterno. No longo caminhar para a reconciliação e a paz efetivas, Moçambique pode recordar com gratidão a visita de dois Papas: S. João Paulo II, em 1988, com o lema “Construamos a Paz na Justiça e no Amor”; e Francisco, peregrino na “Esperança, Paz e Reconciliação”, em 2019. Que a Igreja, peregrina na esperança, continue a ser fermento, sal e luz, em Moçambique e no mundo.