(Ir. Angelina de Oliveira Mendonça, Irmãs Concepcionistas ao Serviço dos pobres) – O Papa Francisco aventurou-se na mais longa viagem do seu pontificado, entre 2 e 13 de setembro, pela Indonésia, Papua-Nova Guiné, Timor-Leste e Singapura. Esta viagem provocou no Papa Francisco a seguinte reflexão: «na Igreja, ainda somos demasiado eurocêntricos, ou, como se diz, “ocidentais”. Mas, na realidade, a Igreja é muito maior, muito maior do que Roma e a Europa, muito maior e – permito-me dizer – muito mais viva, nesses países». É esta vitalidade e alegria, expressa no sorriso das muitas crianças e jovens, que Francisco encontrou em Timor e que jamais esquecerá. É esta mesma alegria da fé, em Cristo vivo, que a Ir. Angelina de Oliveira Mendonça, Concepcionista ao Serviço dos Pobres, partilha nesta Boa Nova. Missionária em Portugal, a Ir. Angelina, de férias em Timor, viveu juntamente com o seu povo a alegria de acolher o Papa com um sorriso rasgado e o coração aberto.

Foi com muito orgulho e emoção que, ao aterrar em Díli, no final de julho, vi uma cidade num grande frenesim para receber o Papa Francisco. Após cinco anos como missionária entre Portugal e Roma, cheguei ao meu país para um tempo de férias e foi com surpresa que vi as avenidas transformadas e decoradas, na alegria indescritível de acolher o Papa Francisco. Estes dias foram um privilégio, vividos, lado a lado, com o meu povo, sempre na expectativa das palavras e dos momentos que iria partilhar connosco o Papa Francisco.
Quando cheguei, vi todas as autoridades do Estado e da Igreja a trabalhar juntas para que tudo estivesse pronto. Foi emocionante perceber que a organização ia para lá das ruas por onde o Papa ia passar, ia para lá da avenida que dá acesso a Tasi-Tolu, lugar onde o Papa Francisco celebrou a Eucaristia com 600 mil pessoas e onde, em 1989, São João Paulo II celebrara quando Timor-Leste ainda estava sob o poder da Indonésia. A mobilização era total. Da capital às montanhas, nas paróquias e estações mais ermas, vi toda a gente de mãos dadas para que fossem dias únicos. E foram, de facto!

Quando, no dia 9 de setembro, o Papa Francisco aterrou no Aeroporto Internacional Nicolau Lobato, o povo de Timor-Leste já se encontrava, há várias horas de pé, como que de sentinela, cobrindo a beira das estradas de sorrisos, acenando com a bandeira de Timor-Leste e do Vaticano. Sob o sol escaldante do meio-dia, crianças e anciãos tentavam proteger-se, com os guarda-chuvas brancos e amarelos. Foi impressionante, assim que se pressentiu a passagem de Francisco, os guarda-chuvas recolheram-se automaticamente para que todos conseguissem ver o sucessor de Pedro passar e foi com muita emoção, lágrimas e alegria que lhe dissemos: “Bem-vindo!”.
Durante três dias, Díli encheu-se de gente. Nos arredores, montaram-se autênticos acampamentos para acolher quem vinha dos lugares mais remotos. Foi um momento histórico para o povo de Timor que, sendo uma nação tão pequenina, sentiu que está no coração da Igreja e isso enche-nos de esperança.
Em todos os caminhos por onde o Papa passou, havia sinais de acolhimento expressados através daquilo que mais nos caracteriza, com os traços da nossa cultura. Colocaram-se “Tais”, tecido tradicional de Timor-Leste, no meio das estradas, construíram-se casas tradicionais e enfeitaram-se as avenidas com as folhas das palmeiras. Emocionada, lembrei-me da entrada de Jesus em Jerusalém. A chegada do Papa era como que a chegada de Cristo vivo à terra do sol nascente!
A presença do Papa Francisco alertou-nos para a forma como vivemos a nossa fé. Com o tema da visita “Que a vossa fé seja a vossa cultura”, o Papa provocou-nos à conversão para que “a fé, que nos iluminou e susteve no passado, continue a inspirar o nosso presente e o nosso futuro (…) isto é, que inspire os nossos projetos e escolhas segundo o Evangelho”. Com este lema, sinto-me desafiada a viver a fé encontrando aí a minha identidade, uma fé inculturada, enraizada na cultura, num modelo maior que é o Senhor.
Francisco conseguiu tocar cada timorense, com as suas palavras simples e doces, de fácil entendimento. Sentimos que acolhíamos um irmão no meio de nós. O povo percebeu o carinho especial do Santo Padre e respondeu com alegria e entusiasmo, ignorando o calor e o cansaço, vibrando ao ouvir o Papa falar em Tétum: “Maromak fó bensaun nafatin ba Timor Lorosae” / “Deus abençoe sempre Timor-Leste”. As palavras do Papa foram ao encontro da nossa realidade e isso fez com que depressa chegassem, também, ao nosso coração. Por isso, não foi de estranhar quando referiu “tende cuidado com os crocodilos que querem mudar a vossa cultura”, mostrando um profundo respeito, cuidado e carinho pelas nossas lendas, mas também apelando ao discernimento de tradições e gestos, com a coragem de defender, também hoje, a fé que liberta e aponta o caminho. Perante isto, o povo aplaudiu em lágrimas, pois muito sofreu para defender o seu país, a sua história, o seu passado e o seu futuro, que sempre colocou nas mãos de Deus, este Deus próximo do qual Francisco é rosto e palavra.
Foi uma graça muito grande, uma felicidade enorme, ter tido a oportunidade de participar na visita do Papa Francisco a Timor-Leste. Já tinha estado junto do Papa em Roma e na JMJ em Lisboa, mas aqui vivi a sua presença de uma forma diferente, sentindo-o especialmente feliz por partilhar estes dias connosco.

É com grande emoção e lágrimas que recordo o que vivi. Tasi-Tolu, lugar onde eram depositados os corpos torturados e violentados dos timorenses durante a ocupação Indonésia, onde São João Paulo II nos visitou e celebrou num momento de grande sofrimento e morte, volta a ser um lugar de ressurreição e de vida nova. Desde a celebração em Tasi-tolu, muitas pessoas continuam a reunir-se lá para rezar. É agora um lugar de paz, como que um santuário, tornando-se um espaço de comunhão entre a fé e a cultura. Este lugar, este país, o coração de cada timorense é terra de Deus, do Sol nascente, onde se sente que o Evangelho é a boa notícia que me fala a mim, que fala a este povo, que fala de um futuro que Deus quer construir connosco!
Termino com as palavras inspiradoras do Papa Francisco, na Catedral da Imaculada Conceição: “Gostaria de me deter convosco precisamente nisto: o perfume, o perfume de Cristo e do seu Evangelho, que é um dom que vocês têm, um dom que foi dado gratuitamente e que devem guardar e o qual sois chamados a difundir. Vós sois o perfume do Evangelho neste país”, recordando porém que “o perfume não é para nós, mas para ungir os pés de Cristo, anunciando o Evangelho e servindo os pobres”. Que façamos do Evangelho a cultura que dá sentido e rumo à nossa peregrinação de esperança e enche de alegria e cor o futuro do nosso país.


